segunda-feira, 2 de maio de 2011

Chocolatão sem inclusão: Projeto apenas habitacional e não social


                                        Foto de Bruno Alencastro

Vila do Chocolatão 
Realocação e despejo no início de maio

A primeira quinzena de maio 2011 será de tristeza para mais de 40 famílias da Vila do Chocolatão. Nesse dia a comunidade será despejada do local onde se encontra atualmente, ao lado do parque harmonia, em Porto Alegre. Parte da comunidade será realocada no final da Av. Protásio Alves; outra parte, correspondente a 44 famílias, ainda não recebeu destino certo pela prefeitura. 

História

Há mais de 20 anos algumas famílias instalaram-se naquela região, poeticamente às costas dos prédios da justiça, na Avenida Loureiro da Silva, em Porto Alegre, constituindo uma das primeiras ocupações urbanas do Brasil formadas essencialmente por moradores de rua. As pessoas dessa comunidade especializaram-se em retirar seu sustento da catação de materiais recicláveis na região central da cidade contribuindo para a limpeza do local e gerando benefícios para toda a sociedade. Suados, empurrando carrinhos, esses trabalhadores despertam interesse e compaixão.

No ano 2002 foi instaurado um Processo Administrativo, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, aquele que está ao lado da comunidade e tem interesse no terreno para a construção de seu estacionamento, averiguando a propriedade do terreno e exigindo a retirada das pessoas que residem lá. Foi criado órgão especial na Prefeitura, a Governança de Porto Alegre, reunindo departamentos, órgãos e ONGs, na preparação para realocação e despejo da população da Vila do Chocolatão da Avenida Loureiro da Silva.

Entristece perceber que essa comunidade, há mais de 20 anos situada no entorno dos prédios da Justiça, tornou-se visível apenas quando houve o interesse na utilização da área. Nunca o poder público moveu-se no sentido de urbanizar aquele local, onde mais de 220 famílias moravam, disponibilizando eletricidade formal, esgoto e água encanada. Entretanto, planeja-se construir no local um estacionamento para o TRF4, e um prédio para o MPF, dentre outros benefícios para a justiça. Saem caixas, papelões e ratos, entram os mármores irretocáveis do poder estatal. Importante ainda pontuar que o trabalho desempenhado pela Governança, tanto na manutenção da comunidade no local quanto na construção de um projeto de realocação respeitador dos Direitos Humanos Fundamentais foi insuficiente, conforme se passará a demonstrar.

O Projeto de Realocação

A fim de analisar a viabilidade do Projeto de Realocação da Vila do Chocolatão, a Associação de Geógrafos Brasileiros (AGB), em parceria com o GAJUP (SAJU-UFRGS) e com o CARU, realizou um estudo junto à comunidade e elaborou um Laudo Técnico Socioeconômico (disponível aqui)


Esse documento revelou que o Projeto apresentado pelo DEMHAB contém uma série de falhas extremamente graves, que, se não forem sanadas, acarretarão mais uma tentativa fracassada de remoção digna de famílias e gerarão a violação dos direitos fundamentais mais básicos dos cidadãos da comunidade:


  • Ausência de participação dos moradores da Chocolatão na construção do Projeto de Realocação;
  • Insuficiência de moradias populares no assentamento: 44 famílias não serão contempladas;
  • Insuficiência dos equipamentos públicos de saúde, educação e assistência social existentes na região do assentamento, que atualmente já se encontra superpovoada;
  • Inconclusão das obras da creche que acolherá os bebês e as crianças da comunidade;
  • Inadequação do tamanho e do padrão das casas, tendo em vista a existência de famílias com características e necessidades distintas;
  • Construção de um galpão de reciclagem, que, por sua capacidade reduzida e insuficiência de equipamentos, comportará apenas parte dos moradores da Chocolatão que atualmente trabalham como catadores;
  • Ausência de conscientização e capacitação da comunidade para fins de adaptação às novas condições de trabalho e moradia. 

Todos esses problemas revelam que o Projeto de Realocação é apenas habitacional, e não social, na medida em que diversos direitos fundamentais (como saúde, educação e geração de renda) simplesmente não serão garantidos na área do assentamento.
A verdade é que, em vez de assegurar a inclusão social dos moradores da Vila do Chocolatão, a realocação em questão os segregará da sociedade e os afastará ainda mais de uma vida digna.
O único resultado que se pode esperar dessa situação é, portanto, um enorme fracasso. De fato, se nada for feito, não demorará muito para que essas pessoas retornem à área central da cidade, em busca de um teto para morar e de um local para trabalhar.


GAJUP/SAJU.

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